Cidade museu – lugar de identidade cultural 

Quero crer que a distinção entre uma casa e um lar não se tenha esvanecido nas ravinas da vida contemporânea. Não há tanto tempo atrás, essa diferença era muito clara dentro do imaginário popular: casa era um espaço gélido no qual não desenvolvemos nenhum sentimento de pertença. As paredes são sempre cinzentas independentemente da cor que tenham. Não há fotografias espalhadas naquele espaço, artefactos sobre os móveis, e o chão é tão áspero que não conseguimos andar descalços por ele.  Já o lar é um campo magnético impregnado pelo nosso toque pessoal, sabemos onde estão os pequenos nadas que lá espalhamos, e é o primeiro lugar que nos vem à cabeça quando somos surpreendidos por um problema intestinal inoportuno.

No lar, há o conforto de se convidar aquele amigo chegado, mesmo que não haja condições para acomodá-lo de forma ideal. Até o chão parece ser mais macio quando se deitamos sobre ele. “Passe pela minha casa. É humilde, mas tem um cantinho especial para ti.” Em frases como essas, tentamos, sem sucesso, esconder o nosso orgulho.

À semelhança do lar, podem ser as cidades que não deixam o progresso antagonizar a sua história.

Espera-se que, quando se andar pelas ruas, dê para sentir o pulsar do coração da ancestralidade daquele lugar. Cada pegada da comunidade timbrada na arquitectura, na gastronomia, na indumentária e afins. Só assim, pode-se somar na diversidade humana.

O propósito não é o de marcar território no mundo globalizado ou não apenas isso. O objectivo é o de ser embaixador de si mesmo, para que os outros possam reconhecer-se na diferença. Pois, a medida de igualdade entre os homens é a diferença.

Os Estados que compreendem o valor da diferença tendem a ganhar muito com isso a todos os níveis. Incluindo, obviamente, a nível financeiro.

As pessoas são atraídas pela história e pagam valores incalculáveis para irem a cidades que falam de si mesmas a partir das suas culturas.

No entanto, é importante enfatizar o óbvio: cidades com esses perfis não brotam espontaneamente do chão. É necessário haver um planeamento estatal com esse objectivo. Planeamento esse que deve ser feito por pessoas especializadas para tal, mas, se me permitem a ousadia de destacar alguns pontos que julgo ser pertinentes, não me farei de rogado:

1 – uma educação autocentrada

É imprescindível, em meu entender, que cidades candidatas a esse perfil possam ter uma educação centrada nas experiências e referências locais. Para isso, é preciso contar a sua história em primeira mão.

2 – Progresso sustentável

É preciso criar uma noção de progresso centrada nas pessoas, de forma que os interesses financeiros não se sobreponham a tudo. Principalmente que esses interesses não se apartem da perspectiva de que o dinheiro deve servir e não as pessoas servirem-se do dinheiro.

Em suma, se pudermos criar uma cidade que nos reconhecemos nela, teremos mais amor por ela e, consequentemente, atrairemos visitas dispostas a pagar para nos conhecer melhor. Ou seja, o projecto de rentabilizar o turismo nacional passa pela edificação de cidades que sejam museus a céu aberto.