Gari Sinedima – Uma Voz Cada Vez Mais Representativa no Jazz Angolano

Gari Sinedima nasceu e cresceu num meio cristão, onde aos cinco anos de idade descobriu o jeito para a música. Ao longo do seu crescimento musical bebeu de experiências de Boy Gê Mendes e hoje é um dos nomes representativos do Jazz angolano, tendo dividido o palco com artistas de renome no género, como Filipe Mukenga. Um artista que vê a música como veículo de mensagem e, agora, na fase de preparação do seu álbum de estreia usá-la-á para passar uma mensagem evangélica à cultura dos homens.

O Artista falou sobre o seu trajecto na música, numa entrevista à revista Palavra & Arte e, dentre vários assuntos, falou sobre os artistas que admira, sobre o que lhe inspira a prosseguir, como viveu o ano artístico de 2016 e o que lhe moveu perante as dificuldades arrastadas pela crise financeira.

Gari Sinedima

Palavra&Arte: Comece por dizer-nos, o que lhe inspirou para ser artista?

Gari Sinedima: O que me moveu para ser artista, foi ter dado conta que a arte movimenta não só pessoas, mas como também movimenta sentimentos e, acima de tudo, transforma. E, esta é a minha filosofia de vida e esta é uma filosofia cristã.

 Essa é a mesma filosofia que lhe move até agora? E continuará a movê-lo como artista?

 O evangelho serve para persuadir, ordenar ou orientar, e a arte tem também essas funções. Então o que me move é saber que, como artista, irei transformar o mundo em um lugar melhor. Então, o que me move como artista são os sentimentos de humanidade, amor e, acima de tudo, bondade e fé na graça de Deus.

 Sente que, com a música que faz, consegue passar esses sentimentos para, como disse, deixar o mundo um melhor?

Sim, é exactamente isso.

tudo que é novo requer um pouco de tempo para nos habituarmos, e a música gospel, a minha fé, não é algo que eu escolhi, porque escolhi, é algo que faz parte de mim e sempre fez parte.

 O seu trajecto musical passou a ter maior visibilidade após o lançamento da música Piluka em 2010. Fale-nos um pouco sobre isso.

 A música Piluka foi mais uma daquelas coisas experimentais que eu sempre gostei de fazer. Para isso, associe-me ao DJ Djeff, a quem eu muito agradeço por também ter me dado a oportunidade de viver com ele bons momentos; aquilo foi, para além de tudo, momentos de amizade, nos conhecendo, foi preciso várias vezes ir para casa dele, conhecer a família dele, conhecer como é que ele vive, como é que ele pensa e resultou naquele todo pacote musical que é o Piluka que, de facto, nós todos sabemos que é uma música intemporal.

O que mais aconteceu na sua carreira de lá para cá?

 De lá para cá, eu amadureci e vou continuar a amadurecer, afinal de contas, são apenas sete anos de música, mas, nesses sete anos de arte, me encontrei: o que eu sempre quis fazer é música gospel, isto é, música gospel ligada à causas sociais, porque, hoje em dia, as pessoas tendem a confundir muito achando que o evangelho tem que ficar na igreja. Não! o evangelho tem que sair, fazer amizades, essencialmente, com outras pessoas, e foi o que eu andei a fazer durante esse sete anos. Fiz amizades, pontes, levei o meu nome fora de angola, nas vizinhas repúblicas, aqui, pertinho de nós, nas escolas. Em tudo que houve arte levei o meu nome para que, acima de tudo, a luz Divina se fizesse sentir mediante a maneira como nós vivemos que é a maneira evangélica.

Da esquerda para direita: Aline Frazão, Gari Sinedima, Irina Vasconcelos, Toty Sa´med

Esses sete anos, serviram para definir a sua carreira como músico?

 Agora é que eu vou entrar na minha carreira como músico, aliás, como músico gospel. Então, esses anos todos, esse período de sete anos, foi de dedicação ao marketing, a fazer links, conhecer outras pessoas para poder ser conhecido e, agora sim, vou levar a minha mensagem, a mensagem evangélica à cultura dos homens.

Ainda sobre o seu percurso musical, fale-nos um pouco da sua passagem pelo projecto Kamutupu.

 A minha passagem pelo projecto Kamutupu foi muito boa, cresci muito. No tempo em que fui integrante do mesmo, tive o prazer de trabalhar com o Ivan Alexei, que é amigo e cantor que muito admiro, com o DJ Smuck, um produtor muito talentoso, e também com o, já renomado, DJ Ricardo Alves, uma pessoa muito humilde, acima de tudo.

Nesse tempo, lançamos uma música (kamutupu) que toca devido à sua qualidade e os integrantes do projecto. Mas hoje me encontrei e estou a fazer aquilo que eu muito gosto e sempre quis fazer: arte por meio da música gospel.

 O Gari tem e faz sempre mênção ao lado gospel, mas as pessoas estão habituadas com um Gari diferente. Não está com receio de vir a perder boa parte do público que já conquistou  cantando outros géneros?

 Essa não é uma questão nova, e muitas pessoas já me colocaram a mesma questão. Naturalmente, tudo que é novo requer um pouco de tempo para nos habituarmos, e a música gospel, a minha fé, não é algo que eu escolhi, porque escolhi, é algo que faz parte de mim e sempre fez parte. Eu tenho uma educação cristã desde a tenra idade e nunca coloquei o gospel de lado, apenas saí para uma maneira de marketing inicialmente, porque qualquer artista deve germinar, deve ser conhecido, deve ter mercado. Eu acho que não tenho ainda mercado, mas estou a caminhar para tal e como estou a caminhar para tal, então, acho que é hora de abraçar aquilo que sempre me identificou, que é a música gospel. Eu vou perder público sem sombras de dúvidas, mas não estou preocupado com isso, porque, quando nós vivemos na graça de Deus, Ele tudo opera, nEle tudo é possível, e eu tenho fé que vou perder e vou ganhar em dobro.

 Isso significa que vai abandonar completamente os outros géneros?

Vou explicar uma coisinha rápida e bem interessante. Na verdade, o termo gospel muitas vezes é usado numa maneira pejorativa e separa muito as pessoas. Desde sempre me considerei músico gospel, porque foi a igreja que me instruiu a cantar, foi a igreja que me deu os primeiros passos de vida de como andar na sociedade, eu só vim para sociedade mostrar aquilo que eu também sei fazer, mas apoiando a cultura dos homens. Eu sempre apoiei a cultura dos homens, mas aquelas boas. Eu sempre hei-de fazer as coisas dos homens, apoiando, porque também vivo na sociedade, mas aquilo que me identifica, como cultura, verdadeiramente, aquilo pelo qual sempre me regi, é a cultura evangélica. O que significa que, sempre onde fui e onde eu for, eu irei como músico gospel. Agora só darei mais ênfase a esse lado, levando as minhas próprias composições. Não tenho nenhuma música gravada de minha autoria, tudo que eu fiz foram participações ou projectos, mas agora vou assumir o meu nome com aquilo que me identifica; com as minhas próprias composições e elas são todas inspiradas na palavra de Deus.

Gari Sinedima

Nota-se que o Gari é um artista de ideias bem formadas e deixa marcas visivéis na sua musicalidade, como é o caso de cantar em línguas nacionais, algo pouco frequente nos cantores jovens. De onde vem a motivação para isso?

As línguas nacionais é algo que está na nossa matriz, está na nossa génese. E como africano que sou, angolano em particular, é uma forma de identificação, preservação e de expressão, inclusive, de estética na arte, pois a arte tem essa representação do belo e das coisas estéticas, portanto é, na verdade, o culminar de toda a educação norteadas aos nossos valores culturais.

 Então sente que cantar em línguas nacionais é uma das formas de valorização da nossa cultura?

Sim, de facto. Sem sombras de dúvidas. Daquilo que é nosso, daquilo que as pessoas pensam que é do mato, mas não, é ali onde está a civilização. Então, eu me expresso em línguas nacionais, porque eu faço parte dessa matriz e conglomerado de línguas e rituais, rituais esses que Deus aprova! Porque aqueles rituais que Deus não aprova, eu não faço. Há culturas que, de facto, Deus não aprova, porque atentam contra dignidade humana.

 Falando sobre o que é da terra, o que o Gari pensa dos artistas angolanos? Tem algum como referência?

 Eu amo todos os músicos (rs). A arte é muito genuína, e cada um tem um toque especial, mas é evidente há coisinhas preliminares que me dizem respeito, que me tocam. Eu sou apaixonado por música de coral; sou eternamente apaixonado por música de coral, porque foi isso que sempre me regeu.
Agora no campo social, temos referencias da música angolana como: Filipe Mukenga, André Mingas, Carlitos Vieira Dias, Belita Palma, Lourdes Van-dúnnen… está a ser difícil nomear, porque eu amo todos… eu tenho um maior pendor para música gospel, por isso vou falar de Dodó Miranda, de Totó, de Simons Massini… é difícil falar de músicos, porque todos eles são bons até os que não fazem música gospel, mas eu amo todos, me inspiro em todos, procuro tirar o melhor de todos e deixar as coisas más.

Gari Sinedima

 Quais são os Artistas com quem gostaria de trabalhar?

GS: Filipe Mukenga, Simon Massini, Ângela Mingas. A Ângela Mingas é sobrinha do André Mingas, é uma grande compositora, sou muito admirador do trabalho dela. Mas, de forma geral, eu gostaria de fazer duetos ou participações com qualquer músico para levarmos a mensagem de amor.

 O ano de 2016 foi para os angolanos recheados de dificuldades devido a crise financeira. como foi para si?

 Meu 2016 foi perfeito. Ano cheio de emoções, cheio de amor, cheio de aprendizagens, cheio de boas lembranças. Tive mais momentos alegres, momentos de ganhos do que momentos tristes e de perda. Deparei-me com situações em que, de facto, tive que olhar, como sempre, para quem nos guia. Várias vezes, reconheci a presença de Deus, reconheci o poder dEle, reconheci a graça, a misericórdia dEle, porque em Deus tudo é possível e vivendo nEle nada é impossível, portanto consegui tudo que eu almejei, algumas coisas naturalmente que também não é pra fazer grandes alardes, porque a própria Palavra nos ensina que há tempo pra tudo, e as coisas que não pude fazer em 2016, farei neste ano.

 E artisticamente falando, foi bom?

Sim, tive muitas actividades, muitos concertos. Estive em palco com pessoas que eu nunca sonhei; estive em palco com Boy Gê Mendes, estive em palco com Patrícia Faria, estive em palco com Filipe Mukenga, estive em palco com Toty Sa’ Med, estive em palco com Aline Frazão, estive em palco com Elizabeth Mambo, enfim… quase todos os artistas renomados do musicol quer africano quer nacional, enfim, foi de facto uma bênção. Consegui atender aos convites de todos os concertos, porque aqueles que eu não vou é porque eu não atendi ou porque não tiveram muito a ver com aquilo em que eu me rejo. Então, sim, atendi todos com quem assumi compromisso.

O Gari disse que dividiu o palco com vários artistas. Que impressões ficaram desta experiência?

Cresci muito. Por exemplo, numa conversa com o Boy Gê Mendes, eu perguntei como era o percurso dele enquanto músico e como ele chegou ao nível que estava, ele disse, simplesmente, uma coisa, disse, nós temos que ser aquilo que somos e temos que unir as várias matrizes africanas com aquilo que… portanto, ele em suma disse, é importante agirmos mundialmente, mas a pensarmos localmente, ou seja, pensar mudialmente, mas agir localmente, o que isso quer dizer, na música, concretamente, é que o Boy Gê mendes, mistura vários ritmos, desde o ritmo folclórico africano ganense, cabo-verdiano, angolano, mas ele transforma aquilo numa linguagem universal, portanto, essa foi uma das fórmulas que eu aprendi com o grande Boy Gê Mendes que é um músico renomado, músico de uma carreira bastante. Aprendi astante e eu aprendo todos os dias, não obstante tudo que passei em 2016. Para dizer que se não fosse o Criador a mandar e nós, natualmente, a nos guiar mediante aquilo que ele ordena, nada disso seria possível.

 Desejamos todo o sucesso na sua carreira musical, e a Revista Palavra&Arte estará por aqui a acompanhar os seus passos.

Obrigado pelo convite e continuem com o bom trabalho que têm feito pela cultura.