Job Siptali

O homem das «Raízes Cantam»

Aí estava o homem (Job Sipitali). Perto da estátua do primeiro presidente de angola. O homem era de altura média, utilizava camisola branca, calças pretas e sapatos de cor branca. Já aguarda por nós havia meia hora. Qualquer pessoa que o olhava logo percebia de que estava fora da sua zona de conforto, de que não era luandense.

Sentado no coração de Luanda, o homem apreciava as pessoas, os carros que, possivelmente, raramente via passar pelas ruas da sua zona de conforto, as torres e as águas que dançavam num sobe e desce por entre as quatro banheiras que enfeitavam aquele largo que encerra a maior e mais linda imagem do primeiro presidente do território que viu Cordeiro da Matta nascer.

O homem assustou quando nos viu. Como que com o coração a bater rapidamente de tanta felicidade, pulou do banco e um kandandu se nos deu. Era visível o contentamento do homem, pois, horas atrás, se nos havia confessado de que não conhecia esta metáfora que chamam de Luanda. Num bate-papo imediato, levávamos o conjunto de ossos do homem de aquele largo para o restaurante sem maneira. O homem atravessava as ruas com uma ligeira pressa. Parecia que desconfiava da seriedade dos automobilistas.

Passadas algumas ruas, postos no velho maculusso, mostrámos ao homem o nosso lar, a aliance française de Luanda e a faculdade de letras da universidade Agostinho Neto. Depois, entramos no restaurante sem maneiras e sem maneiras ríamos e sorríamos. O homem era professor e escritor. nós erámos professor, escritor, crítico literário, bailarino e outras coisas de uma pessoa inconformada. Porém, ao lado do homem, só nos importava olhar para ele, ouvi-lo e aprender com ele. Ele era o caliban e nós o próspero.

Chamámos o empregado de mesa. Este veio alguns minutos depois. Nós pedimos uma pizza para degustarmos na companhia do homem, mas este foi pragmático ao afirmar que não gosta de fastfood. Pediu então um sumo natural de limão e nós, uma musse de maracujá. Tombados alguns minutos, colocámo-nos na posição de entrevistador e começámos a desempenhar aquela que foi a nossa paixão quando mais novo, o jornalismo.

Queríamos saber quais são os pensamentos do homem sobre o mundo, Angola, a literatura angolana, a «geração» de 2010, o ensino superior e a sua escrita.

A tarde já cumprimentava a noite. alguns raios do sol batiam na cabeça do homem. Outros faziam com que o brilho dos olhos escuros do mesmo aumentasse. O homem tomava o sumo suavemente. De quando em quando, interrompia para responder as nossas questões.

Sentado numa cadeira de madeira envernizada, o homem confessou que não sabe se um dia cultivará o conto, a crónica ou o romance. Disse que o INARESS é como uma mãe que duvida do filho cuja luz ela deu. Afirmou que os estudantes da instituição para a qual trabalha não têm o hábito de ir a biblioteca, que o livro é um mistério para muitos estudantes do sul de angola. Salientou que não conseguiria se adaptar a vida de Luanda, teria que, constantemente, caso tentasse viver para Luanda, voltar a Benguela, sua terra natal. Afirmou que se sente abençoado por estar numa geração de artistas da palavra multifacetados. Honestamente, confessou que admira a escrita de alguns dos seus contemporâneos, como Hélder Simbad, Ernesto Daniel, Mariquita 50, Kalunga e Pedro Mayamona.

Questionado sobre a sua escrita, disse que a sociedade, metaforicamente, é o primeiro escritor que se lhe inspira, que a sua escrita surge mediante o contacto entre o urbano e o rural. Confessou ter mais trabalhos para publicar caso haja patrocínio. Sobre o relançamento da sua obra «Raízes Cantam», afirmou que espera ver os jovens e os escritores das outras gerações presentes na casa da cultura Ubuntu, no dia 24 de Maio de 2019, às 18 horas, para comprarem a obra e com eles conversar e aprender mais.

A conversa estava tão boa, mas o homem tinha que voltar para a casa onde estava hospedado. Levámo-lo até a paragem, pusemos o mesmo num azul e branco, pedimos ao cobrador para o ajudar a pegar o outro táxi depois.

Lá ia o carro e nós ficamos com o coração na mão, pois não sabíamos se o homem chegaria mesmo a casa do seu amigo hospitaleiro ou se perderia. Contudo, mantivemo-nos em paz, porquanto, diz a máxima, quem tem boca chega a Roma.