O vazio – Três poemas de Lúcia de Almeida

Na rua as crianças 
com cinzentas ondas nos lábios 
talvez a fome e o nome 
a engolirem asfalto de toda maresia 

Na rua o peito e o tempo 
em berros frenéticos
em forma de papagaios 
dentro do estômago 

A esvoaçar o céu todo
na garganta sensata do tempo

— o oceano no rosto de todas as tartarugas!

VAZIO DENTRO

Sou o corpo pútrido ao sabor do tédio 
sou demoníaca vestida de mortes
vim mudar a aurora 

Com estaca no coração 
minha alma vejo partir 
não consigo falar 
não consigo respirar
que morte triste minha
que morte minha triste

A alma caminha de noite e dia

com medo da morte existencial 
triste sorte 
minha
sim

MORTE LENTA

A morte dura do anoitecer

Essa é a hora do despertar a partida

que assombra cada batida deste desfalecer

e o coração?

Esmagado no prantar do beijo

Sou o erro nascido da culpa

no pecado noturno do mundo

Não sei como lhe chamar: chamo

LENTA MORTE II