Todos transeuntes da avenida José C. Lima circulavam em frenesi, alguns com a cabeça na lua, outros com as estrelas em direcção ao rosto. O clima era um tanto quanto ameno devido à brisa suave da lagoa que se escondia atrás de tudo e de todos, águas tranquilas com um verde-esperança das algas a contrastar com o negro-segredo que se via nascer todas as noites, tão logo o silêncio invadisse a avenida. Como não há nome sem justificações, José C. Lima é o nome da igreja cujo fogo é desenhado junto à cruz, e figurava-se arquitectonicamente semelhante aos templos da Igreja Metodista Unida, cujo seu contributo social se vê no engrandecimento da educação. Fazendo por isso escolas comparticipadas. A educação é a chave do sucesso – é Com esta mesma chave que o jovem Carlos conseguiu, na melhor hipótese, ter a amizade da Aidil.
Adolescentes, inteligentes e dotados de inúmeras virtudes, vincularam sua amizade no interesse de ajudarem-se um ao outro com devida estima e respeito, prevalecendo sempre o diálogo. Passavam uma boa parte do tempo juntos, algumas vezes conversando, mas noutras nem por isso. A comunicação fluía melhor por cartas escritas, com conselhos úteis para vida em sociedade e na academia.
Aidil era devota ao cristianismo, abraçando o catolicismo desde tenra idade. Carlos, um tanto quanto meio crente, acarretava inúmeras dúvidas acerca de lealdades, parecendo, às vezes, céptico em meio de crenças, mas sempre muito cortês nas suas abordagens enquanto mantinha seus diálogos com a rapariga dos olhos castanhos e suas tranças desenhadas no feitio de bobbys, caracóis, et cetera.
Quando o céu derrama suas lágrimas, a terra em gesto íngreme absorve-as de várias formas, nos mares, rios e lagos, e na pior das hipóteses em nossas nobres casas – chuva é benditamaldição, feliztristeza para quem a vê a transformar-se em catástrofe. A chuva tomava conta do céu azul precipitado num branco de uma ave reluzente da paz.
Aidil e Carlos estavam a observar todo espectáculo natural pelos vidros que se embaciavam pela humidade, e a timidez impedia-os de ver e sentir o que acontecia lá fora; vento forte. Depois de algum tempo, chovia a cântaros. Aidil sentou-se, Carlos seguiu bem os seus movimentos e ambos sentaram a olharem um para outro. Aidil dá fôlego aos seus pensamentos
– Carlos, o que é amizade?
– Aidil, penso que amizade é doarmo-nos para outrem com objectivo de fazermos feliz o nosso amigo. É estar disposto a ajudar mesmo quando tudo parece impossível. É surgir como uma fonte de paz para um caos no cosmo que gravita solenemente num turbilhão de misantropia.
Ela sorriu com a alegria do miradouro da lua que olha ao fundo a limpidez dos mares e seus encantos misteriosos, como de Kianda, o espírito encantador d’águas surreambulando o sacrilégio aos deuses.
Retorquiu com seu áspero esgar:
– Carlos, sabes…! Por vezes, em minha mente, a amizade tem um sentido unilateral ao seu, assim como a doação de dois seres buscando o bem-estar, junto à irmandade além de laços sanguíneos, aquela em que dois corações e seus sentimentos conjugam o não importa a etnia, raça, e religião, importa sermos humanos suficientes dotados de consciência plena de que o amor tudo pode e tudo consegue. Amizade é amor.
O semblante da natureza parecia metamorfosear-se em Carlos e Aidil, juntos tornaram-se um só ambiente fraternal, uma nuvem carregada de lágrimas de emoção, um céu azul ao contorno dos seus sorrisos, o sol aquecido de seus abraços, a lua minguante nas noites em que a saudade invadia, uma estrela cintilando nas horas mortas, mas ressuscitadas em pensamentos.
E nem mais um ruído sequer, apenas uma brisa suave fugia do horizonte e vinha abraçar a mesma nascente de água que saciava a sedente alma promíscua a dar vida à amizade. As margens são vidas, conduzidas aos caminhos trilhados pelo coração; o fôlego de amizade é um suspiro do amor na respiração aos encantos dos amigos que decidiram ser chuva ou sereno, cada gota de água que enche de amor e vida a aura do outro – seres que se prezaram ao paraíso.