Barreiras na dança

Tem sido inevitável o crescimento e o aumento de novos centros e casas de cultura nos últimos anos. Para melhorar, ginásios e academias estão cada vez mais empenhados em colocar a dança nas suas grades, já que senhoras de várias idades se mostram profundamente interessadas em fazer aulas, como a zumba ou a salsa, que as possam ajudar a emagrecer e ainda dar-lhes uma aparência fit. Os pais procuram, de todas as formas, colocar os filhos em creches, escolas ou locais com ATL onde, entre as actividades extra-curriculares, a dança precisa estar presente; talvez porque se interessam em desenvolver as capacidades artísticas dos seus filhos ou porque sempre tiveram o sonho de dançar, mas não a oportunidade de o fazerem, ou, talvez ainda, a intenção seja distrair os filhos com actividades que os deixem, na maior parte do tempo, fora de casa para, desta forma, não sentirem tanto a falta de disponibilidade que os mesmos apresentam. Seja qual for o motivo da adesão a esta actividade artística, uma aula de dança não deve ser banalizada.

As pessoas que dançam tornam-se potenciais fontes vivas de criação e de edificação e também de transformação do quotidiano de uma sociedade. Quando tornamo-nos professores, temos a grande responsabilidade de educar indivíduos, e isso exige cuidado e pesquisa. Não podemos esquecer de que somos fonte de  aprendizagem e, antes de nos colocarmos em actividades pedagógicas – referentes ao ensino-aprendizagem –, devemos conhecer os nossos limites e as competências individuais. Depois de detectados os limites, devemos agir, buscando desenvolver as aptidões não construídas.

Muitos são os casos, infelizmente, de professores-relâmpagos, que chegam com o intuito de ministrar aulas que se baseiam apenas nas suas experiências como aluno ou que desenvolvem um método de ensino que exclui a criatividade e a personalidade do aprendiz – colocando em risco o seu desenvolvimento ao não reflectir sobre as implicações corporais –, método este que se apoia na criação de coreografias que têm como principal objectivo fazer brilhar a sua própria imagem; esquecem-se que lhes cabe buscar cursos de formação que auxiliem na continuidade do seu desenvolvimento enquanto educador e promover a capacitação dos seus alunos para o desenvolvimento das competências necessárias para a realização das suas tarefas bem como para a resolução dos problemas quotidianos com maior eficiência.

Parte deste problema recai sobre as instituições de ensino da dança, porque, se como professores a responsabilidade é grande, como instituição a responsabilidade é super-hiper-mega-blaster, ou seja, maior!

Foto alusiva ao evento realizado no espaço EntreDanças. Fonte: Jornal de Angola. Fotografia: Edições Novembro

O que observo em muitas instituições angolanas dedicadas ao ensino das artes ou da dança, mais especificamente, é que todas elas são constituídas com as melhores das intenções, materializadas, talvez, como um sonho antigo para alguns. Mas, com o passar do tempo, percebe-se uma forma de trabalho que foge da nossa realidade cultural, artística e social; um pouco resultado da situação económica que o país enfrenta, mas também por negligência e falta de objectivos bem traçados.

Ao não contratar professores especializados para o estabelecimento e seguir de perto os planos curriculares desenvolvidos pelos mesmos; ao não implementar um sistema de bolsas, para que crianças e jovens menos favorecidos tenham a oportunidade de ingressar; ou ao não dar aos alunos um espaço onde tenham a oportunidade de apresentar as suas obras artísticas, depois de orientados pelos professores; ao cobrar valores exorbitantes pelas aulas oferecidas e pelas exibições realizadas, estabelecendo um público reservado para contemplação dessas apresentações; ao colocar nas grades apenas aulas que estão em alta, pensando somente em lucrar e não em obter resultados para os discentes; ou ao deixar de incentivar a aprendizagem e o progresso ou evolução dos professores e alunos (que podem, possivelmente, ampliar a ambição de seguir uma carreira artística) matam a arte e a necessidade que a própria arte tem de chegar aos corações mais improváveis. E olha que aqui estão enumeradas alguns riscos e formas de aniquilação da arte!

Partindo do princípio que os seres humanos se desenvolvem pelas relações que estabelecem com o seu meio, devemos estar interessados em educar corpos sociais, corpos presentes, que dialoguem, que estabeleçam conexão, que interajam social e culturalmente, ao contrário de corpos que se escondem em casulos ou carapaças, esperando serem moldados, e que os desafios que lhes foram impostos desapareçam.

Por outro lado, os alunos, como parte de todo este sistema, também precisam mostrar interesse genuíno e dedicação ao conteúdo oferecido. É tudo uma troca sem barganhas. O educando tem todo o direito de participar na construção do seu desenvolvimento técnico, sempre em colaboração com o educador, partilhando, respeitando, sabendo que o professor é a melhor referência que terá na sala de aula para o desenvolvimento das suas habilidades e competências. Aos professores, cabe educar cidadãos sócio-afectivos estruturalmente, que se apropriem da dança para fazer alguma diferença no mundo em que vivemos.