O equilíbrio da arte empenhada e o poder do inesperado de Chiquinha

Num mundo obsessivamente habituado a planificações rígidas, a receitas “infalíveis” e a prognósticos, Francisca Nzenze de Meireles, também conhecida no meio artístico como Chiquinha, faz de si e da sua arte exemplo de quem está disponível a aprender com o “agora”. Descolada e incisiva, fez das poucas palavras guias turísticos para dar a conhecer sua visão de vida e de arte, introduzindo-nos , assim, num universo em que ela habita harmoniosamente com o poder do inesperado.

 

Perfil da Artista:

Nome e Pseudónimo (A referência ao nome é opcional)

Francisca Nzenze de Meireles aka Chiquinha

 

Quem é a Francisca (Chiquinha) fora do atelier?

Mãe, esposa, irmã e amiga. Não sou atleta, mas gostaria de ser. Sou de poucas palavras e muitas leituras.

 

Principais influências (nacionais e internacionais)

Não considero influencias, mas sim artistas dos quais gosto muito: nacionais, Sérgio Piçarra; internacionais (a lista é extensa, mas os meus pintores favoritos são Modigliani e Cézane)

 

Como foi introduzida no mundo das artes?

Desde criança, sempre gostei muito de desenhar. Gostava de imitar os desenhos que via na TV. Tentava reproduzir muitas ilustrações e gostava de observar nuvens e o formato que elas tomavam…

 

Recebeu alguma formação ou o seu talento é fruto do autodidatismo?

Até ao ano passado, considerava-me apenas autodidata, mas, recentemente, me matriculei num curso de ilustração e escultura e tenho desenvolvido e aprendido várias técnicas. Abriram-se muitas e diferentes perspectivas para o meu trabalho. Vejo a ilustração e pintura de modo totalmente diferentes.

 

Muitos artistas vêem, na realidade, uma a fonte de suas inspirações; outros, querem ultrapassar a realidade e trazer o surreal ou o utópico. Qual é a relação que a sua arte mantém com a realidade?

Actualmente, estou numa fase de exploração, portanto tenho desenhado muito da vida e do quotidiano. Tenho feito muitas fotografias e passado estas imagens para o papel e tela. Mas também deixo fluir a imaginação e crio personagens, cenários, ambientes e objectos puramente meus e únicos. Nada muito abstracto, mas que podem carecer de explicação ou de uma observação mais profunda. Eu não gosto de criar limites nem imposições, e, muitas vezes, os melhores trabalhos surgem deste modo mais solto e livre de trabalhar. Sem muitas regras, sem muita pressão ou expectativas.

 

Dentro do panorama da arte feita em Angola, o seu trabalho vem para dar continuidade ou fazer uma rotura de paradigma?

Não saberia dizer onde se encaixa o meu trabalho no panorama da arte feita em Angola. Moro fora há oito anos e, desde então, não tenho tido muitas notícias sobre como anda a arte feita na terra. Participei de uma exposição da ENSA há alguns anos e o que vi foram artistas de qualidade muito boa, em termos de técnica. Vi quadros muito bonitos.

 

Pesquisando sobre as suas obras, vemos uma veia direccionada à Banda Desenhada ou, se preferir, cartoons. Até que nível leva esta forma de expressão? Pode-se esperar algum projecto nesta direcção?

Gosto muito de desenhar, e, de facto, a banda desenhada deu um impulso na minha vida artística. Foi através da “kindumba da ANA”, personagem que criei para fazer crítica (bem-humorada) sobre cabelo crespo natural e como a sociedade o encara, que passei a ter mais visibilidade como desenhadora/pintora.

Estou neste momento a trabalhar em outra história de banda desenhada, mas vou deixar a surpresa no ar…

 

Como vê a arte plástica nacional? Sente mais dificuldade ou facilidade em se integrar?

Eu não moro em Angola. Mas quando voltar espero que a cena cultural me receba bem. Espero fazer algumas exposições na minha terra, é claro!

 

Quais são as suas ambições quanto à inserção no mercado internacional? Se houver, quais meios se utiliza para alcançar os teus objectivos?

Como qualquer artista, gostaria muito de alcançar um grande público, não só para vender, mas, simplesmente, mostrar os quadros. Acho que todo o mundo deveria ter acesso à arte, a exposições, a uma visão diferente do mundo, que acho que isso é o que os artistas fazem, mostram a sua visão de beleza e do mundo.

 

É possível ver grandes valores de negritude e uma grande acentuação da figura feminina em seus trabalhos. Entende que a afirmação racial e feminina são as causas da nossa era ou são apenas tópicos circunstanciais?

Eu acho a figura negra feminina muito bela e sinto falta de ver mais mulheres negras e belas nas artes. Mas pinto muitos outros temas e raças. Se tenho preferência por desenhar negras? Sim. Acho que tenho muito ainda a aprender e a explorar, e as mulheres podem ser tão singulares e plurais ao mesmo tempo que vejo uma infinidade de assuntos a explorar.

 

Como é que se define tecnicamente? Segue alguma corrente estética?

Como disse acima, estou a explorar muitas técnicas, muitos materiais. Não saberia me colocar num grupo. Já pintei quadros realistas, meio abstractos e outros mais impressionistas, já fiz banda desenhada e ilustração infantil; estou a trabalhar em esculturas e arte com dobradura em papel… mas me definir… não sei.

 

Quais são os próximos projectos que pretende trazer a público?

Vou continuar a pintar e pretendo terminar este ano a história em banda desenhada. Mas só o futuro dirá. Pretendo continuar a realizar exposições e quero muito expor em Angola.

 

Como se pode ter acesso aos seus trabalhos? Páginas em redes sociais ou blogs.

www.facebook.com/kindumbadaana

instagram: @chiquinhanzenze

 

Como resumiria o seu ano de 2016 no plano artístico?

2016 foi o ano em que realizei a minha primeira exposição individual e, logo de primeira, vendi quatro quadros e recebi muitos elogios! Fiquei muito feliz e me senti mais motivada do que nunca.