Se os candongueiros parassem?

Luanda tem um sistema de transporte. Precário? Não sei. Talvez não. Porque funciona de tal forma que toda população e seus bens movimentam-se e transportam-se graças a esse sistema. Qual é a maka? Todo esse sistema é privatizado por mãos individuais que vêem nisso uma oportunidade de negócio que emprega milhares de jovens, contribuindo, consequentemente, para a “luta contra o desemprego”, como se ouve dizer nos perpétuos discursos de políticos corruptos.

Os Toyota Hiace, vulgarmente conhecido como “quadradinho” – que vieram substituir os Comúteres e Dois-mil, atirados ao museu do esquecimento, ou os acabam-de-me-matar, que resistem ao museu –, aos milhares, formam a maior frota de transporte já visto em Luanda e no país, do qual o governo é alheio, não lhes dando a importância nem a valorização devida. De tão importantes que são e mais capazes que as famintas empresas de transporte de autocarros, porque não têm ainda paragens próprias? Uma das hipóteses de resposta a esta pergunta está na facilidade de extorsão de dinheiro aos motoristas dos táxis pelos agentes reguladores de trânsito. E não admiremos que estes dão de comer bolsos maiores. Mas é esse sistema que põe Luanda às voltas e a funcionar. É tão importante como qualquer outro ministério para a construção do país, principalmente para o crescimento da economia. Mas se os nossos táxis parassem por um dia, o que seria da cidade capital? O que seria da população, das grandes e pequenas empresas. Dá para prever? Acho que sim.

Dificilmente alguém trabalhe neste dia, excepto, em número muito reduzido, os proprietários de carros. Mesmo estes, sendo pais de crianças cujos cuidados são entregues a babás, correm o risco de não trabalharem, já que as babás dependem dos candongueiros, obrigando os pais a ficarem em casa ou arriscarem a levar os filhos ao local de trabalho.

Foto de @joaofreire.photo

As escolas pararão, pois ficariam sem professores, salvo alguns, mas estes a quem dariam as suas aulas, se os alunos, adolescentes na sua maioria, dependem dos candongueiros. Sinceramente, aproveitando a greve da frota de táxis sem taxímetro, seria muito fácil pôr em prática outras greves há muito pendentes, como a dos professores, saindo a rua a reivindicar maior valorização. Se por um lado há os taxistas à procura de respeito e valorização, do outro estão os professores, ambos vítimas da mesma ambição. Mas não fujamos do real tema.

E os hospitais? Quantos médicos não precisariam do sistema de candongueiros para chegarem aos seus locais de trabalho? Reclamam eles também que ganham mal. E não seria difícil acreditar neles. Vejamos: quantos médicos trabalham exclusivamente para uma única unidade hospitalar? Não sei se existe algum que, tendo oportunidade de trabalhar em mais de um, seja exclusivo de um único hospital e/ou clínica. Muito deles acabam tendo carro próprio, graças a este esforço que os mata a saúde que tanto procuram preservar, com enormes dificuldades, em seus pacientes: pouco tempo para descansar, milhares de pacientes para um único profissional da saúde. Sabendo que nem todos eles têm carro, os hospitais tornar-se-iam num caos. Ou talvez não! Que pacientes teriam para atender, se não teriam como lá chegar, já que o taxímetro parou? Morreriam pessoas por não receber atendimento médico urgente. Só os que vivem próximo dos hospitais teriam a vida facilitada, porém estes também enfrentariam a falta de médicos.

O que seria da rádio, da televisão, dos jornais? Haveria informações por estes meios? Ainda acho que sim. Mas com que qualidade, se haveria atrasos de funcionários, para não dizer ausência. Talvez nem uma, nem outra coisa venham a acontecer, pois, pelo que sei, as poucas redes televisivas que há em Luanda têm transportes para os seus funcionários. Será que os jornais têm? A rádio talvez também tenha. Mas neste dia, de sem candongueiro, não seriam mesma coisa.

Não sei se exagero a levantar estas hipóteses catastróficas sobre Luanda no dia em que os taxímetros dos táxis pararem. Imaginem vocês também numa perspectiva mais individual. Há que nos prepararmos, pois pode acontecer a qualquer momento, talvez amanhã. Nunca se sabe.

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