Desconstruir o passado, fragmentar o presente e estruturar o futuro foi a tónica máxima para melhor compreender o tema central da última edição do TEDxLuanda. “Vanguardistas nós somos” nos remetia a várias interpretações, que, com auxílio brilhante de 16 TEDx speackers (palestrantes do TEDx), se descortinou melhor o tema que doutrinou mais uma edição do TEDxLuanda, que decorreu no pátio da Academia BAI.
O momento introspectivo sobre o nosso estado actual, proposto pelo colectivo Pés Descalço e com auxílio e curadoria de Januário Jano, desenrolou-se num clima eufórico onde cada astronauta buscava beber das experiências e ideias capazes de transformar a nossa sociedade de forma positiva e sustentável e, quiçá, moldar comportamento. Os novos tempos obrigam-nos a estar em constantes reflexões que visam não só o nosso modo de vida mas também o mundo à nossa volta. O tempo, este fragmento volátil precioso, faz-nos questionar o homem que fomos ontem, que somos hoje e que seremos amanhã, de modo que as nossas acções possam ser um referencial de identidade para as gerações vindouras.
É nesta revisitação identitária de experiências vivenciadas por cada um dos oradores que foi possível se religar ao passado, compreender o presente e repensar o futuro. O tema vanguardista foi manifestado em acções concretas que vêm sendo empreendidas, umas no anonimato e outras em pleito mais populistas.
Ao olharmos para alguns problemas actuais que têm surgido em decorrência de vários factores sociais, foi possível revisitar o passado cultural dos nossos ancestrais sem desprender deles na totalidade. A experiência fortemente vivenciada pela Doula e professora de youga integral, Sara Lopes, aquando do nascimento de sua filha e o procedimento de cesariana a que foi submetida, da cisão do vínculo maternal e psicológico que pode ocorrer por tal prática, é um incentivo para que as mulheres possam estar cientes da necessidade de manter o vínculo maternal até os últimos dias da gravidez, optando, se possível, pelo parto natural conforme as práticas dos nossos antepassados. Está prática que, além de promover o bem-estar, é também uma porta que permite à própria mulher a consciencialização sobre o sagrado feminino e elevação da sua autoconfiança.
As belas licções sobre a necessidade de aprofundarmos os conhecimentos histórico e cultural do nosso país para melhor empreendermos acções que permitirão posicionar o homem como o centro de qualquer acção foram, em suma, as abordagens da Advogada, blogger e produtora de cinema, Alexandra Gonçalves, que é hoje uma mulher aficionada pelas narrativas de viagens que empreende nas diversas comunidades do nosso país. É no seu blog “The Alexe Affair” que ela nos faz adentrar em várias comunidades desconhecidas, vivenciando experiências que desafiam o nosso lado emocional e o espiritual. Do mesmo modo, Cabuenha Moniz, instrutor de capoeira, foi um dos ted talks que nos fez viajar pelas fortes raízes da capoeira de Angola que hoje é um produto internacional. De forma inspiradora e por meio de uma performance transcendental, Cabuenha Moniz deu voz as canções e gritos de guerra que eram e são entoados em rodas de capoeira, nas noites recreativas pelos nossos antepassados.
Júlio Leitão e Adriano Mixinge, dois grandes investigadores culturais do mercado artístico e cultural, cingiram as suas abordagens no conhecimento comercial e no antropológico cultural angolano e internacional. Júlio Leitão é hoje um coreógrafo com uma vasta obra de reconhecimento internacional. No palco do TEDx, apresentou algumas obras de valores culturais inestimáveis e falou da persistência e relevância cultural do trabalho que vem desenvolvendo. Por outro lado, Adriano Mixingue, crítico de arte, analisou o actual estado do mercado de arte angolano, focando-se, em parte, na história contemporânea da arte angolana, artistas e tendências, e exposições que realçam a diversidade cultural daqueles.
Alguns oradores, apesar de não pautarem as suas abordagens passando pelo tema central, passaram as suas experiências sócio-profissionais de forma motivacional e descontraída, fazendo-nos olhar para aquelas questões de que, como bem disse Anabela Marques, “O essencial é invisível aos olhos”. É nesta linha de ideias que a actual técnica de recursos humanos falou da sua experiência psicológica ao lidar com a problemática de demissões resultantes da actual e não tão recente crise financeira. O jovem físico nuclear, Akiules Neto, mas que, pelos caminhos e voltas que a vida dá, actua hoje na bolsa de valores, realçou a necessidade de sermos multifuncionais, de sermos pessoas camaleónicas, “canivete suíço”, cuja funcionalidade não se restringe apenas a uma função. É deste modo que, assim como ele, qualquer pessoa poderá explorar outras ferramentas além das académicas, pois a inovação nasce ali onde há diversidade do saber.
Os jovens por serem feitos de sonhos, feitos dessa matéria que nasce de forma consciente ou inconsciente, são sempre os mais questionadores do estado actual do homem que compõe a sociedade. A busca por ferramentas para superar os novos desafios não é apenas tema recorrente do seu quotidiano, mas de uma sociedade que a cada dia precisa dar respostas emergentes sem perder de vista a sua identidade e amor-próprio.
É neste cenário quase que caótico que surgem jovens e pessoas inspiradoras como Erickson Mvezi – um sonhador e empreendedor em ascensão que aplica a sua experiência em ambientes de negócios multiculturais para fomentar o ecossistema de empreendedorismo no nosso país –; Saydi Neto, economista, poeta e filantropo – que é também um cérebro pensante da fundação EDUC, instituição sem fins lucrativos que, nos últimos anos tem desenvolvido projectos de cariz educacional em comunidades carentes no território nacional –; Cláudio Silva, um viajante, escritor e gourmet que empresta todo o seu saber em fazer conhecer vários estabelecimentos turísticos e restaurantes deste magnífico país através do portal de crítica culinária LNL – Luanda Night Life –, o primeiro e único portal de crítica a restaurantes, bares e hotéis. Estes e os demais que, com as suas histórias de vida e persistência, passaram pelo palco do TEDxLuanda 2018 transformaram-se em referências com ideias e acções que visam inspirar a nossa sociedade.
De forma geral, O TEDxLuanda, “Vanguardistas somos”, é, na verdade, uma tentativa concreta de se sair na linha da frente ante os desafios actuais. Ser vanguardista remete-nos a cada um de nós, fazer uma revisitação ao passado social, histórico, antropológico e cultural. Ser capaz de fazer reflexões introspectivas que visam a transformação do nosso eu e da sociedade com ideias e acções que inspiram gerações.